Em meados do final da
estação do frio, em meio a torrentes geladas e dias acinzentados, veio a febre
que aqueceu a pele e a alma fria de outrora. Nasce quando dois olhares se
cruzam no relampejar da batida das pálpebras, na lentidão e rapidez de um redemoinho
que distante aponta. Em portas distintas, vidas desiguais num mesmo espaço, num
mesmo instante, num segundo da pupila na pupila. Num desejo de eternidade. Sem
saber que é, mas já sendo, é iniciado o fervilhão intrínseco do que estaria
próximo de tomar um ser em sua totalidade. Mãos, olhos, pele... alma,
sensações, inópia do outro ser... cada desejo sugerido pelo seu olhar, tomava
meu ser num processo de erupção, e a “alma se agita aflita....e como se fosse
praga.... bombeia meu cerebelo...”
Todos os dias que
estariam no porvir seriam de muitos encantos e alguns, mas relevantes, mínimos
desencantos. Cada som seria poeticamente proferido, cada toque profanadamente
celeste...
Era um púbere, mas
ancestral cruzar de olhos, de almas, de intentos... nas ladeiras daquele mundo
que me trouxe você eu me lancei. Como se lança ao rio que corre agitado. Num
mix de medos e certezas. Eram dias de um cotidiano de diálogos agradáveis, filosofias
desarranjadas, resultando em beijos intermináveis, almas se consumindo. Daí
veio a necessidade... O vício da tua presença, do teu gosto, do teu cheiro, do
teu som... Cirandas compassadas, o assinalar rítmico de olhares e murmúrios.
Ecos, numa mistura de timbres e cores, instalando vibrações pelos poros, beijos
carimbados, gotas transparentes de desejo, tocando nas nuvens, no meu céu...
sonhos alaranjados em notas musicais, mesclando-se aos desejos a flor da
pele... os cheiros tão teus, num só meu, corpo meu teu, alma minha tua... e eu
cristalizando no céu dois pares de olhares a contar estrelas... A respiração
pára... pára!