terça-feira, 19 de junho de 2012

Liberté...Grito!! (Carta aos queridos do Distrito Sanitário II)



A vida da gente é necessariamente feita de escolhas. E todas elas vêm carregadas de consequências. Sem nenhuma falsa modéstia ou pouca pretensão, assim como Lya Luft, Clarice Lispector, Lisbela do Prisioneiro, Maria da Penha, Madre Tereza, D. Maria, D. Joseja, S. José e tantas outras e outros, como eles eu escolho a OUSADIA. E não escolho pra viver uma aventura romântica, um desejo revolucionário de um rebelde sem causa. Escolho, e aí digo escolhemos, porque é uma escolha coletiva. Escolho porque tem causa e efeito. É projeto societário e mais do que isso, essa ousadia pra mim e tantos outros companheiros de luta, que estão aqui, do meu lado, olhando pra mim, ou bem longe, é projeto de vida. Tudo o que vem acontecendo comigo e com tantos outros nada mais é do que o resultado de práticas de pessoas que arrotam filosofia e praticam tirania. Não tenho nenhum medo de afirmar isso. Absolutamente. Simplesmente porque é verdade. E não é nela que acreditamos? E não é por ela que estamos aqui? Muitos ancestrais nossos morreram pra que nossa voz pudesse ser ouvida. Muitos pagaram com seu sangue pra nos deixar uma herança de fala não cerceada. Muitos viram suas cabeças rolarem para que a tão sonhada democracia rumasse dos papéis para as ações. Nunca, em nenhuma circunstância eu remaria contra isso. Jamais compactuaria com posturas tão cruéis e egoístas. E a consequência disso é sabida. É pessoal, demitida! Todos vocês são testemunhas da minha paixão pelo SUS, da minha responsabilização com esse compromisso e do meu amor por esse Distrito Sanitário. Não é de hoje que sou parte intrínseca da construção desse projeto que se pretende ser socialista. Daí uns e outros, isso mesmo, uma meia dúzia, surgem do além com discursos midiáticos e práticas ditatoriais. Não sou, não posso e não quero fazer parte disso. E se pra isso eu precise perder meu conforto, minha estrutura, eu quero, eu escolho! Porque prefiro a paz do meu espírito, a consciência limpa e leve, a dor nos braços pela labuta do dia e o sorriso sincero de tantos nos meus olhos. Com a devida licença poética, traduzo minhas palavras nas do poeta e companheiro dessa mesma luta, Lau Siqueira:


“Somos filhos do mangue
refletindo a lua e o
delírio minguado dos becos
espanto e espasmo dos pássaros
que perfuraram o véu da manhã
somos a alegria de quem luta
e o braço forte de quem sonha
colheita de memórias negras
e índias que soçobram das veias
e saciam a sede 
mulheres e homens permeados
pelos ecos da esperança 
...de quem não espera
(peito aberto diante do abismo)
somos o grito das ruas onde
amassamos a vida
transformando labuta em pão
somos a fluidez dos rios
e o aprendizado das nuvens
no traçado rijo dos dias
companheiros de dor e alegria
caminhantes de luz pelas trilhas
desta lúcida utopia
(vencer é nossa mania)”



Aqui ou ali. Onde eu estiver. Onde vocês estiverem. A construção é a mesma. Força, luz! Vamos precisar de todo mundo junto. Cada mão aqui é fundamental na consolidação disso tudo aqui que a gente sua tanto, acredita tanto e luta tanto. Sabe... eu escolho os meus amigos pela pupila, pelos olhos. Aqui fiz muitos. De verdade. Aquela mesma verdade que falei a pouco. Nunca esquecerei dos desafios vencidos, dos dias vividos, das dores compartilhadas, do ombro oferecido. Das risadas trocadas, dos copos virados, dos lanches divididos. Me reconheço em cada olhar aqui dessa família. Em cada um, um pedacinho de mim. E em mim um pedacinho de cada um. O momento além do desabafo é também de agradecer por tudo. Agradecer em especial a Direção e as pessoas que foram minhas parceiras de território. E a todos pela paciência com as piadas muitas vezes impertinentes, pelo excesso de sinceridade, pela dureza nas palavras, pela compreensão das limitações, pela aposta no meu potencial. Isso é pra além do que os “ratos” podem compreender. É para os fortes! Só eles entenderão! E a luta é urgente! Não temos tempo de temer a morte!
Espero do fundo da minha alma poder cruzar com cada um que está aqui na construção de uma cidade verdadeiramente democrática. Onde possamos nos olhar de cabeça erguida. Sem medos, sem amarras, sem prisões. Totalmente repletos do desejo e da possibilidade de construção justa. Na defesa da liberdade como bandeira primeira de todas as nossas lutas. Pra encerrar esse “até logo” vou ler pra vocês uma frase de uma das mulheres mais admiráveis que eu já vi. Ela se chamava Simone de Beauvoir: “Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa única substância”...
Até logo!